Observamos nos últimos anos a grande evolução da inteligência artificial em projetos de automação — tanto residencial quanto comercial — e é inegável: a promessa de conforto, praticidade e eficiência está sendo cumprida com maestria.
Cortinas que se ajustam à iluminação natural, câmeras que reconhecem rostos, sistemas de climatização que aprendem hábitos, assistentes virtuais que coordenam agendas e eletrodomésticos.
Tudo parece feito para nos poupar tempo, energia e esforço. Mas há um elemento nessa equação que, muitas vezes, só é lembrado quando algo dá errado: a segurança cibernética.
Soluções de IA aprendem,
pensam e tomam decisões
A autonomia da IA em ambientes automatizados tem avançado a passos largos. Diferente de sistemas tradicionais, que apenas executavam comandos pré-programados, as soluções baseadas em IA tomam decisões com base em dados — elas aprendem, se ajustam, “pensam”.
Um sistema de iluminação pode reduzir o consumo de energia com base na rotina da casa; câmeras podem diferenciar um morador de um estranho e alertar automaticamente os responsáveis; sensores podem antecipar falhas técnicas e acionar a manutenção antes que o problema se agrave. Em espaços comerciais, a inteligência artificial tem sido aplicada em centrais de monitoramento, controle de acesso, gestão energética, automação de estoques e até análise de comportamento de clientes em lojas físicas.
É uma revolução silenciosa, porém poderosa. Contudo, quanto mais autonomia damos a essas tecnologias, maior a superfície de exposição.
Netflix: uma família lutando contra a IA
A ficção traz histórias curiosas que ilustram este artigo, ainda que com exageros e abusos do direito de fantasiar da arte cinematográfica.
Na Netflix, a minissérie Cassandra, lançada neste ano, aborda a história de uma família que se muda para uma casa inteligente da década de 1970, controlada por uma IA (veja o trailer).
A trama explora as consequências da inteligência artificial e a linha tênue entre tecnologia e terror – o sistema, afinal, faz de tudo para manter a família dentro da casa.
Um sistema inteligente capaz de trancar ou destrancar portas, controlar câmeras, alterar temperaturas ou apagar luzes pode ser extremamente útil — até que caia em mãos erradas. Imagine o que acontece quando hackers conseguem acesso remoto a esse ecossistema. O que antes era conveniência vira vulnerabilidade.
Os riscos da perda de privacidade
Já vimos exemplos preocupantes no mundo real, como câmeras de segurança sendo invadidas transmitindo imagens para terceiros; assistentes virtuais gravando conversas privadas; eletrodomésticos inteligentes sendo utilizados como ponto de entrada para ataques mais complexos em redes corporativas.
Em um cenário onde a IA executa ações com cada vez menos intervenção humana, um ataque bem-sucedido pode significar perda de privacidade, comprometimento físico de ambientes e até prejuízos financeiros sérios.
Por isso, segurança cibernética não pode mais ser um item opcional nos projetos de automação. Ela precisa ser uma premissa básica — desde o planejamento até a manutenção contínua.
Normas internacionais como a IEC 62443, originalmente voltada para sistemas industriais, oferecem diretrizes valiosas também no contexto da automação civil. Documentos como o NIST SP 800-53 também orientam práticas de proteção para sistemas críticos, inclusive os baseados em IA.
Além disso, a certificação de dispositivos IoT e a aplicação de práticas como fail-safe, autenticação robusta, criptografia ponta a ponta e monitoramento em tempo real são medidas cada vez mais urgentes.
Equilíbrio entre conforto,eficiência e segurança
O grande desafio está em equilibrar inovação e segurança. É comum ver projetos extremamente sofisticados em termos de funcionalidade, mas frágeis na proteção contra ameaças externas. Isso precisa mudar.
Precisamos naturalizar a ideia de que sistemas autônomos não podem ser apenas inteligentes — precisam ser confiáveis.
A automação residencial e comercial seguirá crescendo. A IA continuará aprendendo e decidindo cada vez mais por nós. Isso é inevitável — e até desejável. Mas esse futuro só será sustentável se vier acompanhado de uma cultura sólida de cibersegurança.
Porque, no fim das contas, não se trata apenas de conforto ou eficiência. Trata-se de preservar aquilo que é mais importante em qualquer ambiente — a segurança de quem está dentro dele.
* CEO e fundador da TI Safe, uma empresa especializada em segurança cibernética para infraestruturas críticas. Graduado em Engenharia Elétrica, Branquinho é especialista em segurança de sistemas SCADA e membro da International Society of Automation (ISA).
Foto do abre – crédito: AI ATLAS.COM